O
sol está no seu ponto mais alto no céu nos banhando com seu calor revigorante
quando entramos na cidade de Dan. Nossa viagem está marcada para o dia seguinte
e voltamos para buscar nossas coisas. Dan não queria voltar, por não gostar de
despedidas. Mas eu insistira, sua mãe não merecia a dor de ver Dan fugir
novamente sem lhe dar mais notícias.
Eu
agradeci quando ele me prometeu que voltaríamos para visitá-los assim que tudo
estivesse resolvido, o que talvez seja possível se Dan conseguir contatar as
pessoas que haviam ajudado meu pai e auxiliá-los a tomar o poder de Silas. A
família de Dan é o mais próximo de família que eu tenho. O carinho materno de
sua mãe e a altivez do seu pai, que dá lugar à sua sabedoria, quando se acalma.
E
Dan. Dan, minha família, meu sol, meu tudo. Dan observa curioso minha expressão
contemplativa quando entramos em sua rua, passando pela praça repleta de
crianças brincando de ser feliz. Eu sorrio para ele e me sinto incrivelmente
completa, como se o vazio que se abrira em minha alma desde a morte dos meus
pais tivesse finalmente se fechando, como se os meus ferimentos finalmente
cicatrizassem.
E
eu o beijo em gratidão antes que meus olhos se deparem com o caos. Uma vez que
voltando o meu olhar para a casa dos pais de Dan, encontro um automóvel escuro
estacionado à sua frente. Eu reprimo meu grito de horror, quando vejo Dan
transtornado sair do carro num impulso, percorrendo a distância até a casa
antes mesmo que eu consiga me desvencilhar do cinto de segurança.
Percorro
a distância como num sonho em que estamos fugindo, mas que por mais que lutemos
com todas as nossas forças, mal conseguimos nos mover. Alcançando a sala, vejo Dan
atormentado socorrer Adelaide fora de si, quase sem sentidos. Ela se debate contra seu abraço, gritando
palavras sem sentido, tentando se afastar dele, enquanto Heitor, enfurecido,
tenta protegê-la.
Não
sou apenas eu que observo a cena. Há um homem de cabelos escuros e curtos na
sala admirando tudo o que se passa quase que com indiferença, com um humor
sombrio nos seus lábios finos e em seus olhos esverdeados. Eu nunca o vira
anteriormente, e de alguma forma, sei que não é um dos subalternos de Silas.
Não parece se submeter a ninguém, observando tudo e todos com um olhar soberbo.
Encontro
o olhar implorativo de Dan que se dirige furioso ao desconhecido.
__O
que você fez, William?! O que você quer de mim?!
__Eu
não fiz nada, Dan. Apenas contei a sua família quem você é, na verdade. Eu
nunca pensei que eles ficariam tão abalados.
__Henrique,
meu filho! Diga que ele está mentindo! Como você pôde fazer isso?!__Exclama Adelaide
se afastando do filho, embora mal consiga se manter de pé, olhando-o incrédula
e arrasada.
__Um
assassino! Você é um assassino! Saia da minha casa! __Ouço Heitor trêmulo esbravejar
para Dan, segurando com dificuldade Adelaide quase desacordada em seus braços.
Eu me aproximo tentando ajudá-los sendo recebida por seu olhar de repulsa.
__Você não é melhor do que ele! Pagar pelas mortes dos próprios pais! Vocês se
merecem!
__Vocês
mentiram para mim! __Grita Adelaide com esforço, levando a mão em aperto ao
peito, com as lágrimas banhando sua face que se contorce numa expressão de dor.
__Você nunca deveria ter voltado, Henrique! Não é mais o meu filho! Eu não
criei um monstro! Um assassino! Eu não posso ter dado tanto amor a você, para
que se tornasse isso!
__Mãe,
calma. Pai, você já chamou uma ambulância?
__Eu
já chamei. __Ouço William informar indiferente. __Eu não vim executar ninguém.
__Não
me chame de pai! Você deveria ter morrido e nunca ter voltado para sujar a
minha casa, macular a honra da minha família. Você não pertence mais a essa
família, não pertence há dez anos. Nunca deveria ter voltado para nos
envergonhar. Era melhor que tivéssemos sabido apenas de sua morte, ou que nem
mais tivéssemos ouvido nada sobre você. Mas você já está morto para nós. E está
matando sua mãe de decepção. Saia dessa casa e nunca mais volte.
__Pai,
não é o momento para isso. A mãe está muito mal.
__Por
sua causa! Saia daqui. __Heitor vocifera com o rosto em brasas.
__Eu
não vou sair daqui! A mãe precisa de mim! __O olhar de Dan parece perdido, como
uma criança que é descoberta, mas ainda tenta consertar as coisas.
__Tire-o
daqui, Heitor. Eu não posso vê-lo. Isso está me matando. Eu não mereço... __E
então o seu corpo inerte teria tombado ao chão se Dan não tivesse ajudado seu
pai a segurá-la.
Eu
me afasto para que os enfermeiros da ambulância que chegaram pedindo calma possam
passar. Eles levam o corpo de Adelaide até uma maca, sendo acompanhados por Dan
e seu pai, ambos aflitos. Dan insiste para que possa acompanhá-los na
ambulância, no entanto, seu pai reage dizendo que fora sua culpa tudo o que
acontecera, e então desiste permanecendo ao meu lado atordoado.
Eu
o abraço e o beijo tentando tranqüilizá-lo, entretanto Dan se desvencilha do
meu abraço enfurecido, atacando William que permanece estático sorrindo com
sarcasmo.
__É
assim que você recepciona velhos amigos, Dan?! __Sorri não se importando que
Dan esteja o pressionando contra a parede, segurando-o pelo terno escuro, numa
posição que não parece nada confortável, ainda mais com o olhar enlouquecido
que Dan o dirige.
__O
que você está fazendo aqui, William? Eu poderia matá-lo agora. Mas não quero
sujar minhas mãos.
__Eu
diria que elas já estão bem sujas, Dan. E não queremos assustar sua bela
companhia, não é? __Ironiza destinando seu olhar sombrio aos meus olhos, me
fazendo estremecer diante de sua visão ameaçadora. Dan o liberta quando ele
informa que veio em missão de paz, querendo apenas conversar. William arruma
seu terno caro, sorrindo para mim em cumprimento. Eu desvio o olhar com repulsa
provocando sua gargalhada.
__Em
missão de paz, William? Você não vai se meter na minha vida novamente, porque
eu não vou permitir. __Declara Dan tentando recuperar a calma, o encarando
friamente.
__Eu
já me meti, Dan. E não vou sair até que você me dê tudo o que eu quero.
__E
o que você quer além de matar minha mãe?!
__Eu
quero sua ajuda em nome dos velhos tempos. Eu quero sua ajuda numa tarefa que
você não concluiu.
__Do
que você está falando? __Diz, embora eu perceba em seu olhar que Dan sabe e
está apreensivo com o que William pode falar.
__Silas
me contratou para matar os pais dela. E se você me disser onde eles estão, eu
poupo a garota. E disfarço bem melhor do que você a sua morte. Que golpe você
deu no Silas, Dan! Golpe de mestre! Deve ter ganhado uma bolada dos dois lados.
__Os
meus pais estão mortos. __Repito enfurecida pelo que parece ser a milésima vez.
__Tem
certeza, Manuela? __Ouço William perguntar com seu olhar frio fixo no meu.
__Talvez você queira dar uma olhada nisso.
E
então eu pego hesitante o envelope de suas mãos antes que Dan possa me impedir
com um olhar de reprovação. E eu vejo. Meus pais almoçando num restaurante cujo
nome é em francês, embora pela bandeira eu perceba ser no Canadá. Minha mãe com
os cabelos curtos num tom forte de vermelho, com as mãos sobre as do meu pai,
com os cabelos crescidos e uma barba mal aparada.
O
grito de horror que eu liberto faz Dan correr para me abraçar, mas eu me afasto
apavorada. Eles estão vivos! Eles estão vivos! Eu grito repetidamente
incrédula, entre feliz e aturdida. Eles estão vivos! Olho as outras fotos
enlouquecida, outra e outras imagens, em diferentes lugares. Eles estão vivos.
Eu caio em prantos, sentindo minha mente turva, quando o peso do meu próprio corpo
se torna insuportável para mim.
Antes
que eu caia desacordada ao chão sinto o abraço tenso de Dan que se esforça para
encontrar o meu olhar, embora seja difícil enxergá-lo quando minha vista se
torna tão escura, como num eclipse solar, tudo se fechando para mim na
escuridão.
__Manuela,
Manuela! __Ouço Dan exclamar preocupado tentando me manter acordada enquanto eu
não sei ao certo se estou num sonho, num pesadelo ou num mundo paralelo. __Eu
não queria que você soubesse assim.
__O
quê?! __Grito embora minha voz pareça estranhamente distante, assim como o
rosto de Dan, embora eu sinta os seus lábios na minha testa e na minha boca.
__O quê?! O quê?! __Pergunto formando meu próprio eco.
__Eles
quiseram assim. Eles me pediram que fosse assim para sua própria segurança.
Manuela, olha para mim. Olha para mim. __Ordena quando eu não consigo focalizar
meu olhar, sentindo o mundo explodir não de uma forma boa, mas de uma forma
violenta, com meu corpo queimando em desespero e meu coração estourando quando
meu sangue começa a ferver.
__Afaste-se
de mim. __Ouço-me vociferar me afastando do seu abraço e indo até William que
contempla a cena entretido, num ímpeto de consciência, antes que tudo se torne
irreal para mim novamente. __Como você conseguiu isso? Quando?
__Nessa
última semana. Devem estar num passeio romântico e não quiseram levá-la. Eu
sinto muito. Acho que você não era muito bem-vinda.
__Cale-se,
seu idiota. Vai embora daqui, William. Antes que eu não me importe mais em
sujar minhas mãos. __Exige Dan o empurrando violentamente para fora da casa.
__Saia daqui.
__Tem
certeza de que não vai me ajudar, Dan? O Silas disse que perdoaria os dois...
__Dane-se
o Silas, e dane-se você. Vai embora.
Eu
me sento desolada no chão da varanda, quando vejo William ir embora no seu
carro, sorrindo ao olhar para trás. Eu não acredito no que está acontecendo.
Talvez seja apenas mais um de meus pesadelos confusos, que eu não tivera desde
que declarara meu amor a Dan, mas talvez eles tenham voltado. Eu preciso
acordar. Falo para mim mesma, ainda com minha visão turva pelas lágrimas que
banham minha face. Eu preciso acordar e Dan estará ao meu lado para me
consolar, e nós sorriremos disso tudo, porque não é possível que isso esteja
realmente acontecendo.
Meus
pais não podem estar vivos e terem me abandonado por todo esse tempo. E Dan não
pode ter mentido para mim. Isso não está acontecendo. Isso não está
acontecendo. Eu preciso acordar e sentir Dan ao meu lado, me dizendo que eu
apenas tive um sonho ruim. Mas quando eu o vejo se aproximar encarando
apreensivo o meu rosto, percebo que talvez ele não seja uma companhia tão
segura.
Eu
me afasto, levantando-me subitamente, quando ele se aproxima acariciando meu
rosto, deixando um rastro de fogo ao seu mínimo toque.
__Manuela,
eu sinto muito. Eu tentei contar a você...
__Você
tentou me contar?!
__Sim...
Mas você disse que perdoava qualquer coisa que eu tivesse feito no passado, e
eu pensei que isso também estivesse incluso.
__A
morte dos meus pais?! Você deixou que eu acreditasse que meus pais tivessem
morrido! Quantas vezes eu pensei em me matar me sentindo culpada por não ter
lhe entregue à polícia no meu aniversário?
__Eu
não permitiria que você fizesse essa loucura.
__Mas
eu poderia ter feito, e eu estava morrendo por dentro. E você realmente se
importaria, Dan?! Ou não me deixaria fazer isso e me salvou tantas vezes apenas
porque fazia parte de algum acordo doentio que você fez com meus pais?
__Manuela,
me ouve. Os seus pais me pediram para não contar nada a você, para sua própria
segurança e a deles. O Silas me contratou, na verdade, eu apenas fiquei sabendo
pelo Levi, um dos meus contatos, que alguém queria a morte da sua família, por
três milhões de euros. E que assim que eu aceitasse, enviariam a metade para
minha conta. Eu já estava acostumado a fazer isso, e entediado. E era muito
dinheiro. Eu comecei a investigar a sua família, e realmente fiquei surpreso
por alguém querer matá-los. Seu pai parecia muito honesto, por isso eu pensei
em casos de herança complicada, embora não houvesse parentes próximos.
“Por
fim, eu contatei seu pai. Informei-o de que alguém me pagara para matá-lo. Eu
queria uma aventura, me arriscar, algo que eu nunca fazia. O seu pai me disse
que imaginava quem fosse, e que estava com problemas financeiros. Porém, me
falou que se juntasse todas as suas economias conseguiria me dar cinco milhões
de euros, de uma vez só. Ele estava desesperado com a segurança da sua
família...”
__Pára,
Dan. Eu não quero ouvir. Eu não quero acreditar.__Declaro chorosa.
__Você
precisa ouvir. E se você quiser, eu posso deixá-la com eles e conto tudo no
caminho. O William já sabe onde os seus pais estão, e ele é muito perigoso.
__Eu
não vou com você a lugar algum.
__Manuela,
o William descobriu que estamos aqui. Logo o Silas saberá e virá atrás de você.
__Eu
não me importo.
__Eu
me importo. Por favor, entre no carro e ouça o que eu tenho para lhe dizer.
Depois, você pode fazer o que quiser.
Sem
fazer resistência, ainda atônita, me vejo obedecer a Dan, ouvindo contra minha
vontade o seu relato.
__E
então o seu pai me ofereceu um acordo. Eu o alertei de que para terem me
oferecido tal quantia, deviam querer com muita urgência a morte deles, e era
bem provável que tivessem contratado outros executores. O seu pai me disse que
reforçaria a segurança, até que pudéssemos simular as mortes, para que pudessem
fugir do país. Mas temia pelo seu aniversário, uma vez que você não sabia de
nada, e ele e sua mãe não queriam alarmá-la. Eu disse que era provável que
algum outro executor aparecesse, mas o tranqüilizei dizendo que a protegeria.
Ele já havia depositado o dinheiro, e de assassino agora eu passaria a
segurança de vocês.
__Dan,
eu já entendi. __Declaro quando ganhamos novamente a estrada, na direção de
onde pegaremos o avião, tentando conter as lágrimas, para não deixar ainda mais
ridícula minha situação. __O meu pai o pagou para cuidar de mim, para não
atrapalhá-los nos seus planos. Eles não conseguiriam me salvar de todas as
confusões que eu me meti. Foi melhor ter pagado você para me salvar todas essas
vezes. Meu Deus, como eu fui uma idiota. Achando que você tinha me salvado
tantas vezes porque me amava. Eu fui tão ingênua. Meu Deus! Que idiota!
__Manuela,
você não sabe do que está falando! Se eu não tivesse conhecido você naquela
festa, eu nunca teria aceitado esse plano. Fui eu que o propus, porque eu sabia
que seria muito perigoso para você. Eu não estava mentindo quando disse que só
estava retribuindo um favor. Você me poupou de matar inocentes, e eu decidi
proteger você até que pudesse se encontrar com seus pais no exterior.
__Dan,
você não precisa fazer isso. Foi uma farsa. Você estava sendo bem pago esse
tempo todo, e ainda aproveitou para se divertir um pouco. Resolveu misturar
trabalho e diversão. Ah, meu Deus, a não ser que meu pai tenha pagado você para
me conquistar. Ele não faria isso.
__Eu
nunca me venderia dessa forma, Manuela. Eu propus cuidar de você até se
encontrarem num lugar seguro, e sua mãe adorou a idéia. Ela viu que seria mais
seguro, pois se eles fossem pegos pelo Silas, e assassinados, nunca
encontrariam você. E disse que seria melhor que você imaginasse que eles
estivessem mortos, pois não sofreria duas vezes, não teria a esperança de
encontrá-los ainda vivos, nem pensaria em fugir e se arriscar para
encontrá-los. E caso fôssemos pegos pelo Silas, provaria sua inocência se você
não soubesse nada do plano, e talvez ele poupasse sua vida.
__Eles
não tinham esse direito, Dan. Eu queria ter tido direito de escolha, se eu
concordava com o plano. Tudo o que mais me mortificou quando eu pensei que eles
estivessem mortos foi que eu não pude morrer junto com eles. Era tudo o que eu
queria. Ter morrido junto com eles.
__Manuela,
o que você está dizendo? Os seus pais são loucos por você. Eles só quiseram
protegê-la.
__Mas
eles não podiam ter feito isso dessa forma, Dan! E você? Você não precisava
obedecer a eles. Eu não perdôo você por não ter contado a mim. Meu Deus! Eu
entreguei a minha vida a você, e não podia ter me contado algo tão importante?!
Como eu sou idiota. Eu apenas me surpreendo mais a cada dia. Eu me apaixonei
por você quando você só estava fazendo o seu trabalho. Eu achei que você me
amava por isso que estava cuidando de mim. Você deve ter achado que eu era uma
louca e uma oferecida completa.
__Manuela,
eu aceitei cuidar de você achando que nunca tinha ganhado dinheiro tão fácil.
Eu acabava de conseguir oito milhões de euros, quase vinte e cinco milhões de
reais, para forjar três mortes e levar uma garota de dezessete anos para fora
do país. Era só isso. E então você fugiu, eu salvei você. Eu poderia não ter
salvado. Os seus pais fariam o quê comigo? Nós só recuperaríamos o contato um
do outro quando estivéssemos em segurança fora do país. E eles poderiam nem estar
mais vivos. Eu poderia não ter me arriscado. Mas eu fui lá, não foi nada demais
para mim. Porém eu não estava arriscando a minha vida, eu estava arriscando que
você se tornasse uma parte importante dela. Eu não deveria ter me importado com
você, mas eu me importei. E isso acabou comigo.
“Eu
nunca havia me importado com ninguém. No entanto, eu me vi desesperado quando
você fugiu, e furioso por você ter traído a minha confiança. Mas você estava
confusa e eu a perdoei. E então quando você estava conversando com aquele rapaz
na pousada, eu já estava desconsertado com a morte do Levi, e fiquei enfurecido
com você. Aquilo não era normal. Eu quis te deixar lá. Eu deveria ter feito
isso. Uma pessoa importante para mim morrera por sua causa e você ainda estava
flertando com um cara, quando tudo desabava à sua volta. E eu vi naquele
momento, que você já estava virando tudo de cabeça pra baixo, já estava mudando
o meu mundo.
Eu
não podia permitir. Eu tentei mostrar a você quem eu realmente era. E então
você prepara um jantar de Natal, diz todas aquelas coisas, e ainda me beija. Eu
não sei de onde eu tirei forças para me afastar de você naquela noite. Eu
estava fora de mim. E fugi transtornado. Mas você já sabe tudo o que aconteceu
depois. Eu nunca menti para você, Manuela.
Mas
eu devia ter contado, nunca imaginei que essa seria a única forma de evitar
você. Se eu tivesse contado que seus pais estavam vivos, e que havia esperança
de tudo voltar a ser como era antes na sua vida, a sua faculdade, sua cidade,
seus amigos e seu namorado, você nunca teria ficado comigo. Porque você só
ficou comigo porque eu era a sua única escolha. Porque você só tinha a mim, e
era grata.”
__Você
não sabe nada sobre mim, Dan. Eu jamais teria me entregue a você, apenas porque
você era só quem eu tinha, ou por gratidão. Não é porque você mesmo não se ama,
que eu não posso amar você.
__Manuela,
mas é a verdade. E eu queria ter falado desde o primeiro momento, quando você
acordou. Mas qual foi a primeira coisa que você falou? Você agradeceu a mim por
ter salvado você? Não. Você me acusou de ter matado os seus pais, porque sabia
o que eu era, um assassino. Mas quando viu que só tinha a mim, viu que era
melhor do que nada. Quem se apaixonaria pelo assassino dos próprios pais?
__Quem
é você para me julgar, Dan? Eu pensei que tivesse um lado bom em você, mas quem
diria que ele surge apenas quando comprado pelo dinheiro? Ainda bem que meu pai
tinha dinheiro para pagá-lo, senão você passaria por mim e nem ao menos
olharia. Eu achando que você era capaz de amar uma pessoa, mas você só estava
atrás do dinheiro do meu pai. Eu não acredito que fui capaz de acreditar que
você me amava! Você, incapaz de amar qualquer um!
__Talvez
seja melhor assim, Manuela. Que você me odeie. Você não foi a única ingênua.
Pode ficar surpresa, mas eu acreditei que tivéssemos um futuro, só não sabia
que ele duraria tão pouco. E que viraria passado assim que você descobrisse que
todo seu drama foi uma farsa. Eu só não queria ter acreditado tanto nela. Eu
acabei caindo na minha própria armadilha. Mas não me arrependo.
__Não
venha se fazer de vítima, Dan. Você não combina com esse papel. O seu papel
sempre vai ser o de vilão. Porque é isso o que você é. Um assassino. __Soluço,
cobrindo o meu rosto com as próprias mãos. Eu não acredito como posso estar
falando isso, mas talvez com a mesma força que o amo, eu o odeio por ter me
traído, ter me feito acreditar em suas mentiras.
__Eu nunca traí o meu papel. Ainda estou o exercendo como
posso. Mas não se preocupe, Manuela. Eu pararei de ser o vilão da sua vida. É
isso o que eu sou, um assassino. Mesmo quando não sou eu que puxo o gatilho. A
minha mãe está à beira da morte por minha culpa, e com você não aconteceria
diferente se prolongássemos isso. Eu agradeço que a nossa separação não seja
contrária à vontade de nenhum dos dois, e que ambos estejamos em comum acordo.
Os seus pais não precisam saber de nada, nem da sua, nem da minha falha. Ninguém
precisa saber que nós estivemos juntos, se é que nós realmente estivemos juntos
algum dia. Talvez, algum dia próximo ou distante, seja como se nada disso nunca
tivesse acontecido.
E
eu não respondo. Porque com as lágrimas que inundam meu rosto, destruindo a
minha alma, eu não consigo nem mesmo respirar.
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